Mercado negro de cavalo-marinho
Uma pesquisa recente, divulgada na revista científica Frontiers on Marine Science, avaliou a magnitude da captura acidental do cavalo-marinho patagônico (Hippocampus patagonicus) por barcos brasileiros que praticam a chamada “pesca de arrasto de fundo”. Essa prática frequentemente captura organismos que não são o alvo, tornando-se uma das maiores ameaças aos recursos pesqueiros do mundo, segundo o estudo.
Monitorando embarcações pesqueiras do litoral sudeste do Brasil, entre São Paulo e Macaé, os pesquisadores estimam que cerca de 3,7 mil arrastões de fundo percorrem diariamente a região em busca de peixes e camarões. No entanto, no fundo de suas redes carregadas, os pescadores acabam trazendo vários cavalos-marinhos patagônicos.
O estudo, realizado entre 2016 e 2018, focou nessa espécie protegida que não vive quase em nenhum outro lugar do mundo. Liderados pela pesquisadora de cavalos-marinhos do Instituto Hippocampus do Brasil, Rosana Silveira, os cientistas monitoraram cinco barcos de pesca. A pesquisa revelou que, em média, seis cavalos-marinhos são puxados diariamente em cada um desses barcos.
A venda dos cavalos-marinhos capturados acidentalmente
Para a especialista em cavalos-marinhos da Universidade da Colúmbia Britânica, Sarah Foster, em entrevista à Hakai Magazine, embora seis cavalos-marinhos por dia possa não parecer muito, torna-se avassalador quando estendido aos milhares de barcos que compõem a frota brasileira.
Segundo Foster, que não participou do estudo, o conjunto (ainda que limitado) de dados sugere que o número total de cavalos-marinhos arrastados anualmente pela frota pesqueira do Brasil pode chegar a 2,3 milhões de indivíduos. Isso coloca o nosso país no clube de grandes fornecedores de Syngnathidaes, como a Tailândia, o Vietnã e a Índia.
Isso mostra que a pesca de arrasto de fundo brasileira, mesmo que traga esses cavalos-marinhos de forma supostamente acidental, “mostrou-se capaz de ampliar a ‘vulnerabilidade’ e extrapolá-la para um quadro mais grave, caso não seja realizada uma intervenção governamental que possa garantir sustentabilidade aos estoques naturais desta população”, conclui o estudo.
Captura acessória abastece o mercado negro de cavalos-marinhos
Cavalo-marinho (Fonte: Getty Images)
Seguindo uma tendência mundial, o comércio ilegal de cavalos-marinhos como remédio popular ou talismãs floresce no Brasil, disse Rosana Silveira, a primeira autora do estudo, à Hakai. Até 2014, “todo mundo vendia abertamente cavalos-marinhos secos que eram expostos em tigelas ou pendurados em sacos plásticos”, diz Silveira, até que uma legislação de proteção entrou em vigor.
Com isso, afirma a autora, as vendas se tornaram mais encobertas. E, embora não mais expostos nas barracas, se você insistir com um vendedor, dizendo que está disposto a pagar por um tratamento de cavalo-marinho seco, “o peixe vai aparecer”, garante Silveira. Para ela, os números mostrados no estudo sugerem que o mercado negro é provavelmente bem maior e mais clandestino do que se pensava.
Segundo Foster, essas capturas acessórias acabam se transformando em uma séria ameaça à população de cavalos-marinhos no Brasil. E sugere que, em vez de apenas reprimir o comércio ilegal, é necessário que os esforços de conservação se voltem para a redução da pesca de arrasto de fundo. “Em qualquer lugar que haja cavalos-marinhos e haja arrasto de fundo, há um problema”, conclui a especialista.
Fonte: Mega Curioso
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