Pesquisadores não sabem ao certo qual era o sabor do vinho produzido pelos antigos romanos. Era amargo ou doce? Frutado ou terroso? Um novo estudo mostra que a bebida era, na verdade, apimentada e tinha um cheiro de pão torrado.
A pesquisa foi publicada no último dia 23 de janeiro na revista Antiquity. Os autores são Dimitri Van Limbergen, do Departamento de Arqueologia da Universidade Ghent, na Bélgica, e Paulina Komar, da Faculdade de História da Universidade de Varsóvia, na Polônia.
“O vinho estava profundamente enraizado em todos os aspectos da vida romana, e seu papel na sociedade, cultura e economia foi muito estudado”, escrevem os pesquisadores. “Textos antigos romanos e pesquisas arqueológicas fornecem informações valiosas sobre a viticultura e a fabricação, comércio e consumo de vinho, mas pouco se sabe sobre a natureza sensorial dessa mercadoria valorizada.”
Em seu estudo, os especialistas analisaram jarros de argila romanos, conhecidos como dolia, que eram usados para fabricar, fermentar e armazenar vinhos antigos. Eles compararam esses recipientes porosos com outros parecidos: os qvevri, usados em produção vinícolado país Geórgia.
A produção de qvevri georgiano é uma tradição antiga mantida até os dias atuais, inscrita em 2013 na Lista Representativa do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade da Unesco. Ela ocorre especialmente em comunidades de vilarejos onde são cultivadas variedades únicas de uvas.
“O qvevri é um recipiente de cerâmica em forma de ovo usado para fazer, envelhecer e armazenar o vinho”, afirma a Unesco. “O conhecimento e a experiência na fabricação de qvevri e na produção de vinho são transmitidos de geração em geração por meio de famílias, vizinhos, amigos e parentes, todos os quais participam em atividades coletivas de colheita e vinificação”.
Segundo explica o jornal The Charlotte Observer, os dolia romanos também eram contêineres em forma de ovo, e “teriam sido parcialmente enterrados no solo e lacrados durante o processo de produção de vinho, fatores que contribuiriam para o perfil de sabor do produto final”.
Como resultado desse processo e da adição de leveduras naturais, o sabor do vinho romano era “ligeiramente apimentado” e exalava o aroma de “pão torrado, maçãs, nozes torradas e curry”, segundo os pesquisadores.
Vinho tinto ou branco?
Os especialistas também buscaram responder à pergunta se o vinho romano era tinto ou branco. Segundo eles, ao contrário da crença generalizada, parece improvável que a maioria da vinificação na Antiguidade fosse “branca”, ou seja, produzida por fermentação sem peles e sólidos de frutas.
“Em vez disso, a maioria das uvas, independentemente da cor de suas bagas, era vinificada de acordo com o que hoje chamaríamos de vinificação de vinho tinto, com todos os sólidos presentes pelo menos durante a fermentação primária”, contam os autores.
“Isso explica em grande parte a ampla variedade de cores dos vinhos antigos, conforme atestado nas fontes antigas, e a capacidade dos vinicultores romanos de produzir vinhos estáveis numa época sem aditivos e conservantes artificiais”, eles acrescentam.
As cores das bebidas incluíam branco, amarelo-avermelhado, vermelho sangue e preto. Inclusive, os romanos valorizavam tanto essa iguaria que eles até mesmo cultuavam o deus Baco, dedicado ao vinho e à diversão.
Apesar das novas descobertas impressionantes, os pesquisadores consideram que ainda há muito a ser estudado para se entender completamente a produção e as características do vinho romano. São necessários mais dados tanto das dolia antigas quanto de recipientes modernos, além de novas análises de resíduos orgânicos, que facilitarão a comparação das composições químicas dos vinhos em recipientes de cerâmica.
“Ao contrário de tanques de concreto e aço inoxidável (que são neutros) e barris de carvalho (que adicionam sabores suaves de vanilina), ambos muito usados hoje, os recipientes de cerâmica podem contribuir com uma enorme variedade de propriedades sensoriais ao vinho por meio de sua porosidade e composição de argila, muitas das quais ainda precisam ser identificadas”, dizem os cientistas.